Na madrugada de 7 de janeiro de 1835 explodia, na então Província do Grão-Pará, uma das maiores revoluções populares do Brasil Imperial: a Cabanagem. A luta foi formada por diversos segmentos sociais, incluindo muitas mulheres. Na última quarta-feira (07/01), quando são celebrados os 186 anos desse marco histórico, a Secretaria de Estado de Cultura (Secult) e a Fundação Cultural do Município de Belém (Fumbel), promoveram a live "Mulheres cabanas: memórias e contemporaneidades", com a participação da doutora e professora de pós-graduação Eliana Ramos e da mestra em Geografia, educadora, ativista e atual ouvidora-geral do município de Belém, Márcia Kambeba.
A transmissão ocorreu pelo canal da Secult no YouTube e foi aberta com a participação da secretária de Estado de Cultura, Ursula Vidal; do prefeito de Belém, Edmilson Rodrigues, e do titular da Fumbel, Michel Pinho, marcando uma das primeiras parcerias entre Estado e Município em 2021.
Parceria - “Estamos aqui, no Museu do Estado do Pará, que é uma edificação muito simbólica. Foi aqui na frente que os cabanos travaram a luta mais importante, que garantiu exatamente essa tomada de poder, entrando no Palácio do Governo. A gente fica muito feliz com essa parceria. Agradecemos a presença do prefeito, de nossas convidadas, do titular da Fumbel. Para nós, é uma honra essa ação, que reafirma a importância das mulheres. Estamos aqui mostrando para a população que essa será a feição da política pública voltada para a cultura, para a preservação e valorização do nosso patrimônio. Será de parceria, da valorização, do respeito e amizade, para garantir que o que é do povo seja esse espaço de acesso, inclusão e valorização de tudo que é construído pela força popular”, afirmou a secretária Ursula Vidal.
“Iniciamos essa manhã afirmando o sentido cabano da solidariedade numa luta onde os homens, em geral, são tidos como protagonistas de uma revolução popular, que não seria realizada sem a organização e consciência dos limites do início do século XIX e o protagonismo feminino. Então, é com muita honra que participo desse momento na condição de prefeito de Belém, e quero aproveitar essa oportunidade e parabenizar essa parceria entre Fumbel e Secult. E destacar que é muito importante ver esse trabalho, que reconhece o protagonismo das mulheres ao longo da história, principalmente em um momento tão importante como a Cabanagem”, destacou o prefeito de Belém.
A professora de pós-graduação Eliana Ramos, da Universidade Federal do Pará (UFPA), iniciou a palestra destacando as peculiaridades da Cabanagem em relação a outros movimentos no Brasil. Em seguida, ela detalhou a participação comprovada de mulheres no movimento.
“Falar das mulheres é sempre um prazer imenso, mas também é um desafio. Apesar de 20 anos de pesquisa realizada, ainda é difícil encontrar a documentação. É preciso garimpar, e gostaria de destacar a importância do Arquivo Público do Estado. Temos um acervo muito rico nessa temática. Por muito tempo se entendia o movimento como uma construção só de homens, mas encontramos mulheres atuando em diversas posições estratégicas da Cabanagem, seja na linha de frente, nas batalhas, na alimentação, na espionagem ou ainda escondendo cabanos e armas”, disse a professora.
Posicionamento político - Nesse trabalho de recuperação da memória feminina na Cabanagem, Eliana Ramos acrescentou que “temos registros nos municípios do Acará, Igarapé-Miri, Santarém e Marajó. O movimento não foi só em Belém; explodiu nos interiores. De algumas temos mais detalhes, como nomes. De outras, por exemplo, sabemos que foi indígena e mulheres que acompanhavam suas famílias nas lutas. Isso mostra claramente o posicionamento político das mulheres na Cabanagem. Temos situações claras, onde podemos ver o protagonismo das mulheres”.
Márcia Kambeba destacou que “nós, mulheres indígenas, somos a continuidade de muitas lutas. Geralmente somos citadas sempre como submissas. De maneira nenhuma! Sempre estivemos dentro das lutas, como acabamos de ter a confirmação na pesquisa da professora. Por muito tempo, estamos resistindo ao processo de dizimação, e não é somente por arma de fogo e arma branca. Mulheres indígenas, como Gregória e Bertolina, foram brutalmente assassinadas dentro de um movimento como a Cabanagem. Elas lideraram rebeliões, foram capturadas e torturadas, esquartejadas. Temos que refletir sobre o nosso papel como mulheres. Essa é uma dor não só da mulher indígena, mas a dor de todas as mulheres. A presença e a luta das mulheres, às vezes, são invisíveis pela história, e é preciso que a gente conte e reconte, muitas vezes, para nossos pequenos. É pela oralidade que se faz esse aprendizado, e a gente reconstrói nossa história também”.
A palestra completa está disponível pelo link: https://youtu.be/BBnG5fKZd9s
Texto e fonte: Josie Soeiro (SECULT) / Agência Pará
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